Telemedicina como aliada na gestão do cuidado de pacientes portadores de doenças crônicas durante a pandemia

O isolamento social trouxe como agravo a impossibilidade de acompanhamento presencial para portadores de doenças crônicas; monitoramento a distância assegura a continuidade do cuidado

Telemedicina como aliada na gestão do cuidado de pacientes portadores de doenças crônicas durante a pandemia

Sem tempo para ler? Clique no player abaixo para ouvir.

A crise trazida pela pandemia se desdobrou em facetas diversas e uma delas, em especial, impactou diretamente portadores de doenças crônicas — aqueles que convivem com quadros de saúde não emergenciais, como diabetes e hipertensão, mas que necessitam de constante acompanhamento. A imposição do isolamento social, no início da pandemia, e o temor de sair de casa, agora que a flexibilização já é uma realidade, podem refletir em uma redução na adesão de acompanhamentos. Assim, a telemedicina ganhou peso na estratégia de gestão do cuidado de crônicos.

"Portadores de doenças crônicas podem ter riscos minimizados se a doença estiver sob controle, mas só é possível se certificar disso se houver acompanhamento", alerta Daniel Barretto Kendler, coordenador adjunto do curso de medicina da Universidade Estácio — Campus Presidente Vargas, e vice-presidente da Sociedade Brasileira de Diabetes-RJ.

"Muitas das doenças crônicas, em destaque diabetes e hipertensão, podem estar totalmente descompensadas, levando risco ao paciente, mas ele sequer sente qualquer sintoma", salienta.

Além de todo o impacto na qualidade de vida da pessoa, evitar agravos à saúde também mitiga, por consequência, a necessidade de exames e procedimentos mais complexos e, consequentemente, custosos.

"Ter um paciente com diabetes controlado, com oferta de consultas, exames e até medicações necessárias por 30, 40 anos, por exemplo, tem um impacto financeiro muito menor do que se esse mesmo paciente tiver um infarto e for submetido a uma cirurgia cardiovascular, a um cateterismo com angioplastia, ou até mesmo sofrer um acidente vascular encefálico e que o deixe incapacitado para atuar profissionalmente", afirma Kendler.

Para estruturar um fluxo baseado em telemedicina, é importante ter em mente alguns passos:

 

1. Estabelecer buscas ativas

Não se pode esperar que todos os pacientes saibam que a teleconsulta e teleorientação estão disponíveis nas clínicas ou hospitais que fazem acompanhamento. Portanto, o primeiro passo é comunicar à base sobre a alternativa.

"Se o paciente estava agendado, como para uma consulta de retorno, por exemplo, pode-se ligar e ofertar a possibilidade de consulta a distância", aponta Kendler.

"Claro que o paciente pode não querer a teleconsulta, mas outros sequer imaginam que existe a opção e é importante que seja ofertado a ele."

 

2. Vencer resistências

Nesse contato, a entidade de saúde pode encontrar ainda outro obstáculo: a resistência à adesão à teleconsulta. Nesse caso, é importante contextualizar sobre os impactos da decisão em seu tratamento, em uma tentativa de convencer sobre a importância de seguir com o cuidado mesmo que não seja considerada a maneira "ideal" pelo paciente.

Nesse sentido, adotar a rotina de um termo de consentimento esclarecido pode deixar o indivíduo mais ciente das limitações dessa modalidade de atendimento e permitir uma adesão ao serviço com um alinhamento de expectativas previamente estabelecido.

 

3. Dar atenção às nuances

A teleorientação é um dos variados braços da telemedicina. Segundo o médico Chao Lung Wen, professor associado e chefe da disciplina de telemedicina da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP), trata-se de um "complemento à consulta médica" (remota ou não) e tem como finalidade explicar ou conduzir adequadamente a situação do cidadão, considerando que, na maioria das vezes, o médico já tem um diagnóstico fechado sobre ele. Especificamente no cuidado com pacientes crônicos, é necessário um pouco mais de atenção, explica Kendler.

"Ainda estamos engatinhando nesse sentido, e ainda há muitas nuances que são percebidas apenas no contato com o paciente", diz.

O especialista aconselha câmeras abertas — tanto do médico quanto do paciente — para não haver perda de contato e garantir que os aspectos mais sensíveis da relação não sejam perdidos. Quão mais parecida a experiência for com o modelo convencional, melhor. O fato dos atendimentos remotos ocorrerem, na maior parte das vezes, dentro da casa dos pacientes pode trazer mais informações para o momento da consulta, como observação do ambiente domiciliar pelo profissional, maior familiaridade com o manuseio de equipamentos pessoais (preferencialmente, selados pelo Inmetro) para aferição de sinais clínicos ou mesmo realização de terapias com materiais de uso doméstico, promovendo uma participação mais ativa e um maior empoderamento da família no cuidado com o seu familiar.

 

4. Propor um plano continuado

Especialmente no tratamento de crônicos, é essencial estruturar um plano de acompanhamento de longo prazo. Nada disso muda com a telemedicina. A frequência dos atendimentos está diretamente ligada ao quadro apresentado por cada paciente, bem como a doença, avisa Kendler.

"Por exemplo: um diabético bem controlado é possível realizar um atendimento hoje e outro daqui seis meses", aponta.

"Do contrário, se a doença está mal controlada, em que estou iniciando medicamento tipo insulina, posso fazer uma hoje e ter de fazer outra daqui três dias, ou daqui uma semana. Então, pode variar muito."

Cada paciente, portanto, deve ter um plano pessoal, condizente com seu quadro. Com a adoção da telemedicina de forma mais ampla na pandemia, também há relatos de serviços que tiveram uma redução na taxa de absenteísmo, provavelmente promovida pela facilidade de acesso em comparação ao atendimento presencial. Outro movimento que têm sido observado é a disponibilização de agendas híbridas pelos serviços em processo de reabertura. Desta forma, o profissional tem a sua agenda tanto com vagas para atendimento presencial como para atendimentos por teleconsulta.

 

Tecnologias acessórias

No trato do paciente crônico a distância, é fundamental aliar a telemedicina a outras tecnologias já conhecidas no contexto da Saúde Digital. Uma das mais essenciais é o Prontuário Eletrônico do Paciente, o PEP, que centraliza o histórico do indivíduo e permite acesso ágil às informações. A demanda se reforça especialmente quando a pessoa tem um quadro de saúde mais complexo, que demanda o cuidado coordenado entre diferentes especialidades.

Kendler alerta para a necessidade de integração, também da telerradiologia, pois o acompanhamento pode gerar a necessidade de investigações mais aprofundadas.

"O exame é feito em um local específico, mas é possível transferir imagens para um radiologista em qualquer ponto no planeta e ele é capaz de dar um laudo como se ele estivesse na clínica."

O especialista ressalta que alguns exames necessitam de contraste, sendo importante ter ao menos um médico na ponta para realizar essa fase. No mais, os exames podem ser laudados por outros médicos a distância.

Notícias MV Blog

;