Da Saúde Digital 4.0 para a 5.0, os impactos na jornada do paciente
Com a adoção da chamada Saúde Conectada, a experiência do cliente com a instituição passa a ser baseada em valor e em dados, tudo em prol do melhor desfecho clínico possível
Depois da transformação digital impulsionada pela pandemia, o setor de Saúde começa a caminhar para a Saúde 5.0, a próxima etapa da jornada da Saúde Digital. Para que esse passo seja dado com segurança, a adoção de um sistema de gestão amplamente conectado é a maior necessidade das organizações que querem começar a usar soluções avançadas como big data, machine learning e inteligência artificial (IA), entre outras ferramentas preditivas já disponíveis.
Márcia Makdisse, médica cardiologista com PhD em Medicina e MBA em gestão da Saúde, além da certificação Green Belt em VBHC e do mestrado em transformação de sistemas de Saúde pela Universidade do Texas em Austin (EUA), deixa claro o quanto a Saúde 4.0 foi importante para a incorporação da tecnologia da comunicação e da informação no setor de Saúde.
A especialista afirma que a Saúde 5.0 — ou a Saúde Conectada, como alguns já chamam — irá muito além e terá uma relação maior com a adoção dessas tecnologias durante a jornada de tratamento dos pacientes no modelo de cuidado em que estão inseridos.
“A Saúde 5.0 não envolve apenas a interoperabilidade dos dados. Ela diz respeito, também, ao quão responsivo é um sistema frente às demandas pelo cuidado das pessoas e das populações. Portanto, eu enfatizo que a Saúde Digital só vai gerar mais valor à medida que estiver conectada com o modelo de cuidado que vai ser alavancado pela tecnologia”, frisa Márcia.
Esse modelo de cuidado mais conectado citado pela especialista tem potencial tanto de melhorar a saúde do paciente quanto a sua experiência durante o cuidado. Tudo isso impactará positivamente os desfechos em Saúde.
“O foco da Saúde 5.0 precisa ser responsivo às necessidades dos pacientes para que não esteja mais preso às doenças e, sim, à saúde das pessoas”, resume a médica.
Caberá às equipes clínicas realizar sua coordenação através do acesso a sistemas de gestão interoperáveis que garantem que as métricas calculadas sejam acionadas sempre que preciso.
Dessa forma, a Saúde Digital estará ligada à VBHC (Value-based healthcare) para inaugurar a Saúde Digital Baseada em Valor, um conceito cunhado pela Asociación Salud Digital (ASD) em parceria com a Universidade de Deusto na Espanha, onde Márcia atua como professora colaboradora.
“A saúde baseada em valor demandará uma mudança no modelo desse cuidado, com a coleta sistemática de desfechos e de custos para uma nova forma de pagamento que deixe o sistema de Saúde sustentável ao longo do tempo”, exemplifica Márcia.
A melhor experiência no cuidado, a um custo mais adequado e com redução de desperdícios é o grande objetivo do uso dessas tecnologias, que podem ser desde ferramentas de coletas de dados de desfecho até a disponibilização dessa medição da Experiência Relatada pelo Paciente (Patient Reported Experience, Prems) e dos Desfechos Medidos pelo Paciente (Patient-Reported Outcome Measure, Proms) no prontuário eletrônico para uso da equipe assistencial, seja durante a consulta de rotina ou no compartilhamento dos desfechos com o paciente, para que as tomadas de decisão sejam feitas em conjunto, mas sempre guiadas por dados.
Por isso, a captura constante desses dados via wearables tem grande potencial de melhorar a saúde das pessoas, desde que essas informações estejam, de fato, inseridas em um modelo de cuidado onde são compartilhadas com todo o time multiprofissional responsivo, especialmente em casos de pacientes com doenças crônicas como diabetes e doenças cardiovasculares, conforme conta Márcia:
“Na Holanda há um exemplo bem legal de prática integrada, chamada Diabeter, que é focada no cuidado integral do paciente com diabetes infantojuvenil. Eles possuem uma interface que conecta e compartilha os resultados diários de glicemia e hemoglobina glicada com a equipe assistencial. Assim, os profissionais de Saúde conseguem rapidamente tomar decisões em casos de descompensação e de ajustes nas doses de insulina. E tudo é feito a distância com uma equipe de suporte que tem acesso ao prontuário em tempo real.”
Para os pacientes que não têm uma doença crônica diagnosticada, como a Saúde 5.0 pode ajudar?
A resposta está na promoção da atenção primária, que será fundamental para organizar melhor todo o sistema de Saúde, mas sem impedir que o paciente acesse diferentes níveis de atenção.
“Na VBHC, a ideia é que se abandone o conceito de ‘gatekeeper’ dado para a atenção primária e passe a adotar a ideia de ‘quarterback’, na qual esse ‘zagueiro’ distribui e direciona os recursos para prevenção e promoção da saúde ao mesmo tempo em que promove a equidade no acesso e o direcionamento correto para o cuidado que o paciente precisa”, descreve a especialista.
Ainda será preciso educar a população de que os serviços de especialidade e de emergência não devem ser as portas de entrada preferenciais à assistência em Saúde, mas sem impedir que os pacientes tenham acesso a esses formatos sempre que precisarem, recomenda Márcia.
“A tecnologia é mais uma vez aliada nesse contexto, porque permite a estratificação do risco e a segmentação da população atendida em linhas de cuidado, e, com isso, pode ajudar a criar uma agenda remota em que o acesso ao time assistencial será indicado via telemedicina ou de forma presencial, em cada caso individualmente. Se isso não ocorrer, o paciente vai continuar a se dirigir ao hospital de emergência mais próximo mesmo com toda essa conectividade.”
Toda essa revolução tecnológica tem apenas um objetivo final: a melhora na saúde das pessoas ao longo do tempo, que pode ser medida por meio de índices de qualidade de vida e funcionalidade e também por métricas que apontem uma melhor experiência no cuidado. Com a vantagem de gerar um menor desperdício de recursos humanos e financeiros a todos os atores envolvidos na Saúde Digital.