Saúde digital: o que é preciso para a interoperabilidade decolar de vez no Brasil?

Num contexto de padronização, o uso das mesmas terminologias evita expressões locais e neologismos, adotando, assim, classificações formais para doenças, eventos, procedimentos, entre outras situações

Saúde digital: o que é preciso para a interoperabilidade decolar de vez no Brasil?

A capacidade de diferentes sistemas e plataformas se comunicarem de forma automática otimiza a rotina dos profissionais e melhora a experiência dos pacientes. Podemos considerar que a interoperabilidade é fundamental para salvar vidas. Sendo assim, é sempre válido reforçar que a interoperabilidade permite o compartilhamento, a interpretação e o uso de dados e informações entre todas as áreas de uma mesma organização e também entre diferentes empresas e elos do setor de saúde. 

O Projeto de Lei 3814/20, em tramitação no Congresso Nacional, trata justamente desse tema e visa determinar que o Sistema Único de Saúde (SUS) mantenha uma só plataforma digital com informações de saúde dos pacientes. Se aprovada, e a expectativa é a de que seja, a ansiada interoperabilidade no setor de saúde ganhará força. 

“Uma plataforma digital unificada para prontuários médicos, resultados de exames, procedimentos ambulatoriais, receitas médicas, entre outras informações, é um sonho e será um passo importante para a transformação digital necessária na saúde”, observa a coordenadora acadêmica do MBA em Engenharia de Dados do Centro Universitário FIAP, Regina Cantele. “Uma vez aprovada, essa lei desencadeará a otimização dos serviços da saúde e permitirá democratizar todo o sistema, no âmbito público e privado”, completa. 

O caminho a ser percorrido para a integração dos diversos sistemas das empresas do setor de saúde é muito longo e passa por desafios técnicos relevantes, envolvendo a padronização da informação e a segurança dos dados, por exemplo. Por isso, se as perspectivas a partir da interoperabilidade são otimistas e as empresas do setor aguardam-na ansiosamente, é importante também se planejar e se precaver para os riscos associados a esse processo.  

Fatores críticos a serem superados 

O compartilhamento de informação entre organizações de saúde e agentes de saúde deve promover a sua correta interpretação, com a mesma precisão e significado adotados na origem do dado. Essa é a base da interoperabilidade. No entanto, ainda há, no setor, dificuldades na adoção de padrões e ferramentas que garantam aos profissionais de saúde uma gestão eficiente dessas informações. “É necessário usar um padrão internacional para garantir uma sintaxe e formatos amplamente aceitos”, orienta Regina Cantele. “Outra preocupação é a segurança. A troca de dados entre diferentes instituições deve abranger políticas seguras, mesmo para troca entre sistemas proprietários.”  

A especialista acrescenta que a ampla variedade de tipos de dados gerados durante o atendimento de um paciente — sejam eles estruturados, como códigos de diagnóstico, ou não estruturados, como notas clínicas — raramente são sincronizados automaticamente de uma plataforma para outra, forçando a inserção das mesmas informações em dois ou mais sistemas. O que causa outro desafio, já que as informações devem ser tratados adequadamente para evitar interrupção dos processos, por exemplo. 

Como começar a interoperar dados?  

O ponto de partida para essa desafiadora e transformadora jornada, de acordo com Regina Cantele, é estabelecer os requisitos de interconectividade necessários para que um sistema ou aplicação troque informações com segurança e receba dados de outro sistema. Em seguida, é preciso definir o formato, a sintaxe das palavras e a organização da troca de dados. 

“Complementando estes passos, é preciso incluir considerações de governança e políticas sociais, legais e organizacionais para facilitar a comunicação segura, contínua e oportuna, assim como o uso de dados dentro e entre instituições e indivíduos”, orienta Regina.  

O indispensável fator humano 

Não só de fatores técnicos se faz a implementação e o exercício da interoperabilidade. Vale sempre reforçar que a capacitação dos profissionais da saúde é um pilar importante. “A adoção de um novo padrão reflete em todos os processos administrativos, desde a inclusão de registros médicos, imagens radiológicas, medicamentos, pagamento e reembolso, além dos dispositivos médicos, sistemas de monitoramento, dentre outros”, analisa a coordenadora do FIAP. 

“Cada padrão apresenta seus guias de implementação, onde descrevem como realizá-los.  Embora se possa implementar um padrão de várias maneiras diferentes, ao usar um guia de implementação para integrar um padrão a um sistema de TI de saúde, o roteiro orienta uma maneira de restringir esse padrão a uma situação específica, removendo a ambiguidade e obtendo consistência”, diz Regina. 

É sempre bom lembrar: as possibilidades e benefícios 

Para as instituições, reflete-se na redução de custos e melhora do planejamento dos seus recursos e processos. Já para os provedores de planos de saúde, em especial, é uma solução para a diminuição nas fraudes. Para o paciente, por sua vez, essa integração significa uma redução na realização de procedimentos, muitas vezes invasivos, e a visão da sua jornada de saúde durante todos os períodos de sua vida.  

“O compartilhamento, muitas vezes espontâneo de dados, tem movido a cultura data driven em todos os setores. Na saúde, em breve, emergirá soluções digitais criativas que romperão o status quo existente, promovendo melhora no uso dos recursos nas instituições e na saúde dos cidadãos”, finaliza Regina.  

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