Dois lados: gestão da operadora e o impacto dos miniplanos de Saúde

Intenção de operadoras em criar planos segmentados ou customizados gera polêmica na Saúde Suplementar, que busca alternativas para a perda de beneficiários ao longo da crise econômica

Dois lados: gestão da operadora e o impacto dos miniplanos de Saúde

Entre 2014 e 2018, auge da crise econômica, as operadoras de Saúde brasileiras perderam em torno de 3 milhões de beneficiários, conforme a Associação Brasileira de Planos de Saúde (Abramge). Atualmente, 47,1 milhões de pessoas possuem convênios médicos no País, sendo que 19% desse total são individuais e familiares — representando um nicho com possibilidade de expansão para a gestão das operadoras de Saúde

Na tentativa de ampliar esse mercado, as operadoras brasileiras querem propor novos produtos, como planos segmentados ou "customizados". Na prática, seriam versões reduzidas, focadas em alguns serviços e tipos de atendimentos. Mas a medida gerou polêmica no setor: as regras atuais da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) preveem uma lista mínima de serviços que a gestão das operadoras deve obrigatoriamente ofertar em seus planos. 

“Acredito na união de prestadores e operadoras para oferecer planos com atenção primária e rede coordenada, que eliminam os desperdícios do sistema.” Fernando Torelly, economista com passagens pelos hospitais Moinhos de Vento e Sírio-Libanês, pela Central Nacional Unimed e superintendente do Hospital do Coração - HCor (a partir de janeiro de 2020).

 

Atenção primária

A Saúde Suplementar está perdendo clientes desde 2014. Em 2019, especificamente, o setor investiu com a expectativa de que haveria crescimento, mas o que teve melhor desempenho no período foram justamente os planos de baixo custo. Vejo esse movimento como uma resposta a toda essa questão macroeconômica que estamos vivenciando no Brasil. Precisamos apresentar uma solução para o mercado. É uma questão delicada lançar um plano que exclui determinadas patologias do tratamento, porque saúde não tem como prever. E pode até gerar mais judicialização.

Eu acredito em planos regionais, feitos por meio de parcerias entre operadoras e rede de fornecedores. Ou seja, prestadores se unindo às operadoras para apresentar soluções com atenção primária e rede coordenada, proporcionando a redução de desperdícios do sistema e, consequentemente, ampliando o acesso das pessoas. É preciso mudar o modelo atual e investir em coordenação do cuidado — e isso não pode ser feito só pelas operadoras.” 

 

Integração das informações

O insumo fundamental para esses planos com atenção primária é a integração das informações por meio de um sistema de gestão. Assim é possível coletar dados da atenção primária, do médico da família, de medicina ocupacional, integrando tudo no prontuário do paciente. Essa forma de trabalho possibilita a criação de condutas personalizadas, capazes de reduzir a incidência de casos agudos e, consequentemente, trazer mais qualidade de vida à população assistida.” 

 

Saúde baseada em valor

O que temos que ofertar são os planos que tenham coordenação do cuidado e rede integrada, que entregam valor para o beneficiário. A Central Nacional Unimed, por exemplo, está lançando um produto em São Paulo com esse perfil de medicina de família, com foco em promoção e prevenção. Essa é uma tendência para os novos produtos. E para gerar esse valor que o beneficiário vê e percebe, os sistemas de informações são decisivos.

Eles não trabalham de forma a frear os reajustes dos planos, mas sim na intenção de criar toda uma nova lógica de remuneração baseada em performance, completamente diferente da matriz aplicada hoje. Esse modelo vai incentivar a parceria entre prestadores, hospitais e operadoras com um mesmo objetivo, que é cuidar das vidas. Os players do setor estão brigando demais, baixando muito a confiança e perdendo clientes. Se não mudarem, vai chegar um dia em que não haverá mais clientes pelos quais brigar.” 

 

“Um plano que não abrange o mínimo de cobertura deixa o beneficiário em uma situação muito complicada.” João Sobreira de Moura Neto, diretor de Defesa Profissional da Associação Paulista de Medicina 

 

Novos planos

“As operadoras perderam beneficiários com a crise econômica e estão tentando se reinventar. Mas o que temos que defender aqui é o trabalho do médico e a saúde da população. Quando se fala de miniplano, é preciso ter muito claro o que será oferecido. Um plano que não abrange o mínimo de cobertura deixa o beneficiário em uma situação muito complicada. E se ele precisa ser internado? Se precisa de cirurgia? Paga e não tem? Dessa forma, quem será mais impactado é o SUS (Sistema Único de Saúde), que já recebeu toda a carga de beneficiários que saiu da Saúde Suplementar por conta da crise econômica.” 

 

Questão econômica

“Não dá para partir só do pressuposto financeiro para a criação de novos modelos de planos de Saúde. Isso precisa ser estudado de forma minuciosa. Se os miniplanos oferecerem algo que não tem efetividade no atendimento integral à saúde, de que servem? Na nossa visão, essa proposta tem como foco maior a questão econômica, e deixa de lado o fato de que a saúde de um indivíduo é imprevisível.” 

 

Redução do desperdício

"O que precisamos é ampliar o acesso à Saúde Suplementar por meio de operadoras sólidas, com gestão bem conduzida e condições de ofertar planos que ofereçam o minimamente obrigatório. Precisamos cumprir a Lei 9.656/68, que regulamentou os planos de Saúde no País e garantiu os direitos dos cidadãos.

Se permitimos a criação de planos que não cobrem esse básico, é um retrocesso. E isso mexe com a segurança das pessoas. O que devemos buscar é a racionalização da assistência, redução de desperdícios, uso de protocolos clínicos, tecnologia que municie o profissional de Saúde para a tomada de decisão, desospitalização. Alternativas que reduzem custos sem deixar de prestar a assistência. E todas elas só serão possíveis quando o setor começar a dialogar.

Notícias MV Blog

;