Como prover uma Saúde Pública de qualidade em tempos de crise?

A crise econômica é capaz de afetar a área da Saúde de diversas formas e isso nós já sabemos. 

Como prover uma Saúde Pública de qualidade em tempos de crise?

No caso da Saúde Pública, em particular, o impacto pode ser mais direto, como atrasos nos repasses e diminuição do financiamento, ou ainda vir indiretamente, como o aumento da demanda nas unidades básicas de Saúde e hospitais em razão do desemprego (situação onde o cidadão supostamente perde o plano de assistência privada, então buscará atendimento na rede pública).

Por outro lado, não podemos ignorar que o Sistema Único de Saúde (SUS) teve avanços nos últimos anos, tanto no campo da vacinação quanto no enfoque maior para a atenção primária à saúde, portanto o melhor é que essas conquistas não sejam perdidas e que, mesmo em tempos de recessão econômica, a Saúde Pública continue disponível para os usuários. A tentativa de elevar a qualidade dos serviços será sempre um desafio para qualquer esfera, pública ou privada, porém no texto de hoje vamos refletir sobre as formas de prover uma Saúde Pública de qualidade, mesmo diante de um contexto desfavorável como o atual. Confira!

 

Principais cuidados

Para compreender melhor o quadro de crise na Saúde brasileira é fundamental considerar que temos problemas na estrutura física, sofremos com a escassez de material (incluindo medicamentos e equipamentos) e os recursos humanos são, em geral, insuficientes e mal preparados. Dito isso, alguns cuidados tornam-se fundamentais na gestão da Saúde Pública, são eles:

 

Quanto ao recebimento de recursos

Não só é necessário ficar atento ao repasse dos recursos — pois, inclusive, há situações onde o atraso no repasse leva secretários municipais a movimentar ações judiciais —, como também é importante cumprir as determinações do governo federal. Como sabemos, a esfera federal atua por programas, determinando que seja feito o envio obrigatório de informações, mas também atua solicitando a implementação de novos sistemas de funcionamento. O descumprimento das determinações pode ocasionar a perda dos recursos, daí a importância de redobrar esse cuidado.

 

Quanto ao planejamento das ações

Não abandone o planejamento. Se for preciso, faça uma reavaliação do quadro e elabore novos planos mais realistas, procurando envolver toda a equipe, motivando e sensibilizando os profissionais para que se comprometam com os resultados. Busque praticar uma gestão mais transparente e verá que é possível alcançar melhorias significativas. Em um artigo acadêmico sobre planejamento em saúde, o professor e médico Jairnilson Silva Paim aborda a função do planejamento e defende que um documento desse tipo, quando elaborado contando com uma maior participação das pessoas realmente interessadas em mudar a situação, pode transformar a realidade.

 

Quanto ao processo de gestão

É unânime entre os especialistas da área que os dois principais problemas a afetar o sistema público de Saúde no Brasil são a gestão ineficiente e o subfinanciamento. Existem divergências sobre um ou outro ser mais grave, no entanto, é preciso sempre considerar ambos se o objetivo é fazer uma análise realista da situação. Ocorre que, em tempos de crise, os recursos tendem a ficar ainda mais escassos, assim otimizar a gestão é ainda mais urgente.

Tornar o processo de gestão mais fluído, dinâmico e transparente fará com que os recursos sejam mais bem aproveitados. É preciso identificar os gargalos, buscar apoio tecnológico, motivar a interação da equipe e adotar sistemas informatizados, entre outros passos capazes de transformar o processo de gestãoVale lembrar que o cenário de crise consegue inspirar novos projetos, muitos deles vindo depois a se tornar bem-sucedidos.

 

Como a crise impacta a saúde pública?

Em períodos de crise a má gestão leva a falhas graves no controle de estoque, podendo culminar no desperdício ou simplesmente na ausência de medicamentos para os usuários. Esse fato é constatado numa matéria jornalística de 2014 sobre situações ocorridas no estado do Rio de Janeiro e no Sergipe.

Já em junho de 2016, conforme publicado, os problemas de atraso no repasse dos recursos fizeram com que a situação se agravasse no interior do estado de Minas Gerais, deixando a Saúde Pública à beira de um colapso. O fato é que quando existem atrasos na liberação das verbas, ou por parte do estado, ou por parte da União, os usuários sofrem as consequências. O não recebimento dos recursos a tempo também pode fazer com que fornecedores e até médicos tenham seus pagamentos atrasados, além de suspender a ocorrência de cirurgias, ou mesmo consultas e exames.

A falta de dinheiro acaba por forçar que se escolha manter apenas os setores de urgência e emergência funcionando, deixando o resto descoberto. A realidade é que as cidades se desdobram para conseguir lidar com as contas. Em alguns casos, alegam que o que se gasta com a Saúde vai além dos mínimos obrigatórios de 15% da arrecadação do município e de 12% da arrecadação dos estados.

A longo prazo, a falta de recursos inibe melhorias nas estruturas, que vão se desgastando até o limite. Em condições de precariedade apenas se consegue administrar o mínimo e as escolhas são duras. A crise gera tamanho descontrole que pode fazer ressurgir doenças antes erradicadas, ou mesmo novas epidemias. Não apenas os usuários dos serviços de Saúde saem prejudicados, mas também os próprios profissionais atuantes, como médicos, enfermeiros e auxiliares de enfermagem.

 

Quais as soluções possíveis?

Cortes de serviços e de pessoal costumam ser as primeiras medidas diante da escassez de verbas, mas esse caminho nem sempre tem impactado de maneira positiva a situação.

Embora a elaboração e aplicação de um bom planejamento possam, em se tratando do sistema público, implicar em alguma burocracia, o melhor é não se deixar desestimular assim e insistir em planejamentos realistas, contando com o apoio da equipe ativamente e participativa. Um planejamento estratégico deve ser objetivo, ter praticidade e ser flexível. Aliás, flexibilidade é um fator essencial em um contexto de crise.

Outro ponto é buscar elevar o nível de organização, implementando padrões para dinamizar o fluxo dos processos. O atendimento bem realizado na rede primária evita que ocorram grandes filas de espera nos hospitais. Nesse ponto, o uso da tecnologia pode ser bastante eficaz, não é por acaso que foi determinado um prazo limite para que os municípios adotem o sistema de prontuário eletrônico nas unidades básicas de Saúde (UBS).

As informações organizadas de forma eletrônica possibilitam consultas ao histórico do usuário em diferentes UBS. O atendimento acaba por ser menos demorado e mais preciso, pois haverá nos prontuários um registro de informações sobre o paciente. A propósito, mecanismos de coleta e análise de dados e informações têm se mostrado uma ferramenta eficaz no atendimento de Saúde à populaçãoNo contexto da crise, é importante conseguir tomar as decisões mais acertadas, por isso é essencial que essas decisões tenham fundamento sólido, baseado em informação.

A persistência em manter políticas públicas de Saúde com foco na prevenção é uma iniciativa capaz de gerar bons resultados a longo prazo. É fundamental mantê-las ou, se preciso, desenvolvê-las com mais ênfase. Surtos de dengue, por exemplo, podem sobrecarregar as unidades e instituições de Saúde, complicando bastante os problemas que já existem no curso normal de atendimento.

Estabelecer metas qualitativas e quantitativas para incentivar a equipe é uma receita tradicional para lidar com os profissionais. O melhor é que todos os envolvidos na gestão desenvolvam uma consciência mais aprofundada sobre suas funções e a importância de cada uma delas para trazer mais qualidade à assistência de Saúde.

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